quinta-feira, 27 de junho de 2013

Crônica do Dia-V (do Vinagre)

Os policiais da primeira barreira, relaxados e separados por uma certa distância (20-06-2013). Do lado direito, na encosta, os restos do painel de Siron Franco. Um exemplo emblemático da negligência que assola Salvador há muito tempo. Foto: Simanca

Coloquei um short, uma camiseta, uma sandália e fui para a manifestação do dia 20 de junho. Na concentração, na frente do Teatro Castro Alves, havia jovens e adolescentes com as caras pintadas. Havia também outras pessoas não tão jovens, algumas que provavelmente lutaram contra a ditadura. Todas com um ideal, o de melhorar o Brasil.

Os cartazes tinham reivindicações que estão engasgadas há muito tempo nas pessoas não alienadas. Todos estavam em paz, com a convicção de que se está em uma luta justa e necessária. Não havia ninguém que pudesse ser caraterizado como vândalo.

Como a manifestação estava demorando para sair, dei a volta no Campo Grande e fiquei do lado do Forte de São Pedro. Tinha-se criado um impasse: um grupo queria ir pela Av. 7 de Setembro e outro pelo Vale dos Barris. Decidi adiantar pela Rua Direita da Piedade, e me juntei aos manifestantes que já começavam a descer. Um indivíduo que destoava com o sentido do protesto soltou um foguete e foi repreendido, na hora, com a expressão: ‘Sem violência’.

Cheguei com a vanguarda e fiquei do lado esquerdo do painel que Siron Franco fez para Salvador. Curiosamente, as peças deste painel foram depredadas por vândalos, que até agora nunca foram encontrados. Se fossem presos, provavelmente não ficariam um dia na cadeia.

A falta de cuidado com o patrimônio público por parte dos governantes, que não cuidam, nem conservam, e deixam destruir para depois revitalizar, também faz parte do descontentamento dos manifestantes.
Os baderneiros, os vândalos, os assaltantes, os marginais, já estavam agindo décadas antes de começarem os protestos e raramente são punidos severamente. O papel da polícia é de reprimir a delinquência, e não de educar. O papel de educar é da escola. A polícia não deve reprimir jamais um cidadão pacífico!

Na primeira barreira de PMs, estava tudo aparentemente calmo. Não havia nenhuma cerca, arame farpado, nem linha delimitadora, nem placa com a advertência “Perigo, não ultrapasse”. Os policiais da primeira linha estavam relaxados e separados por uma certa distância, parecia que deixariam passar até a segunda barreira de policiais com um aspecto agressivo. Estavam com armas letais e menos letais, finamente acompanhados de cachorros das raças fila e pastor-alemão.
Por um momento acreditei que toda essa parafernália intimidatória era para conter baderneiros. Onde eu estava não tinha vândalos, minhas preocupações eram infundadas.

Devo confessar que fiquei intimidado. Não estava preparado para isto. Em caso de um ataque, minha vulnerabilidade era total. Se imaginasse esse “estado de sítio”, pelo menos teria botado duas calças jeans, duas camisas grossas de manga comprida, umas botas, uma máscara antigás, cotoveleiras, óculos herméticos resistentes a fortes impactos e um capacete.

Começaram a chegar mais manifestantes. Pensei: “Não vão jogar gás lacrimogêneo em pessoas pacíficas e ‘Sem Violência’. Por precaução, falta de equipamento e forma física, o melhor é analisar o perímetro e ficar longe do alcance das armas dos militares”.

Já estava afastado da linha de fogo, bordeando a cerca da quadra de futebol, quando o primeiro estrondo atravessou o ar. Uma fumaça foi cobrindo meu flanco esquerdo.

Vários meninos e meninas saíram em disparada. Os ‘velhinhos’ experientes dos tempos da ditadura já estavam numa área segura, aproximadamente a uns cem metros de mim.

Fiquei um tempinho do lado da cerca, esperando os militares recarregarem para me deslocar para a trincheira dos veteranos. Atravessei a rua, calmamente. Não por eu ser fleumático, nem ter sangue-frio. Não tenho forma física para correr, já disse antes.

O pânico tomou conta da massa. Depois do primeiro estampido da bomba, o sentimento de “Sem violência” tinha terminado. Só se escutavam palavrões dos pacíficos, sufocados e cegos temporariamente pelo gás.

Alguns jovens, com o espírito de Gandhi momentaneamente destruído – que não são nem baderneiros, nem vândalos – voltavam para enfrentar a polícia. Os palavrões já se escutavam praticamente em coro, misturando-se com o ‘boom!’ das bombas. Respirei profundamente... o gás tinha-se dissipado. Lembrei de Confúcio: “Quem controla sua ira, controla seu pior inimigo”.

Simanca
Hoje no jornal A Tarde

Manifestação em Salvador-Ba/Brasil. Registro dia 20/06/2013 16:43. Video: Tahara Akemi. Facebook

Um comentário:

Vini Black Cat - miau miau disse...

Assinando, gostei do blog pena que nao esta atualizado mas ta de boa..
o meu tambem ta assim kkkk

Abraços mano!